sexta-feira, 17 de julho de 2009

Meu Ócio/Gustavo Moreno

"Esta é uma questão que possui um alto grau de contemplação, cujo foco está localizado numa descrição temporal.Vou buscando na memória, pois ela lida com a maior de todas realidades, que é o tempo. Lembro ainda criança quando achava o ócio coisa de vagabundo. De lá pra cá, episódios se passaram e nortearam muito minha maneira de lidar com o ócio, e com a vida de um modo geral. Prevaleceram aspectos transparentes, e o começo de uma busca onde se evidenciava a sabedoria de encontrar um lugar no tempo.Tive o prazer de conhecer relatos de uns dos maiores artistas brasileiros da atualidade, Cildo Meireles, e aprendi muito. Ele tinha aulas com um artista peruano chamado Alejandro Barrenechea que eram, basicamente, fundamentos do olhar. Ficavam olhando durante quatro horas para a mesmo objeto de arte. A intenção não era admirar sua exepcionalidade, ou sua fisicalidade, a idéia era cessar o olhar, impregnar-se no objeto, tranformar-se nele. Resolvi fazer experiências desse tipo ao ar livre. Sentei numa praça, o ambiente era calmo, mas mesmo assim ouvi sussurros dizendo que ali estava um maluco. Essa é uma das questões estruturais da minha vida. Encontrar um lugar no tempo, tornar presente o que está ausente.
O problema em relação ao chamado tempo ocioso é sua própria ausência. Todas as manhãs tento desligar a máquina, ficar cinco minutos sem pensar em nada, já que dormindo penso muito. Isso dá certo, recarrega. O importante é lidar com esse atrito permanente de forma experimental. Acredito que podemos utilizar o ócio como um processo de esponja, absorvê-lo, para depois extrair casualmente o que o tempo nos reservou em determinado momento. Procuro ultrapassar essas barreiras entre o trabalho e o ócio, entre a ficção e a realidade, numa espécie de visão conciliadora. Penso, portanto, que não devemos abdicar do nosso ócio, pois ele é uma pérola, que deve ser lapidada a cada minuto para que possamos encontrar um lugar no tempo."


*Gustavo Moreno é artista plástico

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